quinta-feira, 18 de outubro de 2018

E, porque acreditava...


“Ela acreditava em anjos e, porque acreditava, eles existiam.”
Clarice Lispector

Delicioso mergulhar no profundo dizer incutido em tão singela frase.
Tudo adquire realidade à medida da crença que damos ao que nos é dito. Vamos pensar?

Disseram-me que Deus é real. Eu acredito; sim, Ele existe. Porque acredito Ele é real pra mim. Eu sinto sua suave presença me proporcionando uma indescritível força. Se você não acredita em Deus, Ele não pode existir pra você!
É assim. Podemos tornar reais coisas boas como Deus, como também coisas más que nos fazem acreditar: aquelas coisas que muitos dos que estão a nossa volta dizem sobre nós, que não necessariamente nos representam. Falas que, se abrirmos a porta, entram e se alojam tornando-se hospedeiros indesejáveis.
Por um longo tempo vivi assim, acreditando nas mentiras ditas sobre mim e, porque acreditava, em verdades elas se tornavam.
Via-me refletida nos espelhos construídos em olhares cruéis. Uma imagem distorcida de mim, que mostrava um ser que não era; pintado com grosseiras tintas em pincéis de aço. Quanto mais nesses espelhos eu me olhava, mais feia acreditava ser e, porque acreditava, feia me tornava.
Ouvia discursos feitos sobre mim por insensíveis bocas. Falas duras, ditadoras, manipuladoras. Me ditavam a timidez, a pequenez, a infantilidade, a incapacidade. Dizeres repressores que diziam que eu era assim e, porque acreditava, assim eu era. 
Aquelas crenças que determinavam em quem eu me tornava. Mas aos poucos elas começaram a não fazer mais sentido. E eu, eu comecei a questioná-las, pois ao estar longe daquelas deturpadas falas, eu não agia como elas diziam. Ao estar delas afastada, eu encontrava a mim mesma. E nesses encontros havia alegria, força, ousadia. Mas ao voltar...
Quando voltava, novamente me vestia das velhas crenças. Foi então que comecei a indagar: “Sou o que sou ou sou o que não sou?” e comecei a ver que aquela não era eu; um ser moldado em arcaicos moldes. Então decidi desacreditar. Mesmo escorrendo sangue, precisava arrancar aquelas tintas com que me pintaram; fechar a porta para quem eu não queria dentro da minha casa, ignorar aquelas vozes.
Desacreditei e, porque desacreditei, as velhas crenças começaram a deixar de existir. Ao tirar aquelas tintas me vi de verdade. Vi-me bonita, alegre, colorida; harmônica arte; ser precisando ser remoldado em contemporâneos moldes. Olhei-me pelo espelho dos meus olhos; gostei de me ver refletida ali. Comecei a ouvir a voz da alma. Esta voz  que me diz que sou capaz, que me impulsiona a ter ousadia, que me mostra que sou viva, sou grande, sou mulher que deseja viver o que é!
Desacreditei para acreditar. Acreditar em mim e, porque acredito, eu existo.

Haliny


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