“Ela acreditava
em anjos e, porque acreditava, eles existiam.”
Clarice
Lispector
Delicioso mergulhar
no profundo dizer incutido em tão singela frase.
Tudo adquire
realidade à medida da crença que damos ao que nos é dito. Vamos pensar?
Disseram-me que
Deus é real. Eu acredito; sim, Ele existe. Porque acredito Ele é real pra mim.
Eu sinto sua suave presença me proporcionando uma indescritível força. Se você
não acredita em Deus, Ele não pode existir pra você!
É assim. Podemos
tornar reais coisas boas como Deus, como também coisas más que nos fazem
acreditar: aquelas coisas que muitos dos que estão a nossa volta dizem sobre
nós, que não necessariamente nos representam. Falas que, se abrirmos a porta,
entram e se alojam tornando-se hospedeiros indesejáveis.
Por um longo
tempo vivi assim, acreditando nas mentiras ditas sobre mim e, porque
acreditava, em verdades elas se tornavam.
Via-me refletida
nos espelhos construídos em olhares cruéis. Uma imagem distorcida de mim, que
mostrava um ser que não era; pintado com grosseiras tintas em pincéis de aço.
Quanto mais nesses espelhos eu me olhava, mais feia acreditava ser e, porque
acreditava, feia me tornava.
Ouvia discursos
feitos sobre mim por insensíveis bocas. Falas duras, ditadoras, manipuladoras.
Me ditavam a timidez, a pequenez, a infantilidade, a incapacidade. Dizeres
repressores que diziam que eu era assim e, porque acreditava, assim eu era.
Aquelas crenças
que determinavam em quem eu me tornava. Mas aos poucos elas começaram a não
fazer mais sentido. E eu, eu comecei a questioná-las, pois ao estar longe
daquelas deturpadas falas, eu não agia como elas diziam. Ao estar delas
afastada, eu encontrava a mim mesma. E nesses encontros havia alegria, força,
ousadia. Mas ao voltar...
Quando voltava,
novamente me vestia das velhas crenças. Foi então que comecei a indagar: “Sou o
que sou ou sou o que não sou?” e comecei a ver que aquela não era eu; um ser
moldado em arcaicos moldes. Então decidi desacreditar. Mesmo escorrendo sangue,
precisava arrancar aquelas tintas com que me pintaram; fechar a porta para quem
eu não queria dentro da minha casa, ignorar aquelas vozes.
Desacreditei e,
porque desacreditei, as velhas crenças começaram a deixar de existir. Ao tirar
aquelas tintas me vi de verdade. Vi-me bonita, alegre, colorida; harmônica arte;
ser precisando ser remoldado em
contemporâneos moldes. Olhei-me pelo espelho dos meus olhos; gostei de me ver
refletida ali. Comecei a ouvir a voz da alma. Esta voz que me diz que sou capaz, que me impulsiona a
ter ousadia, que me mostra que sou viva, sou grande, sou mulher que deseja
viver o que é!
Desacreditei
para acreditar. Acreditar em mim e, porque acredito, eu existo.
Haliny