quinta-feira, 20 de setembro de 2018

O rio da vida

A vida é como um rio.
Rios nascem de pequenas fontes.
Fontes vêm de águas submersas, desconhecidas. Águas do interior que mansamente rompem a íngreme terra ansiosas para explorarem o misterioso mundo externo. Elas não sabem o que vão encontrar; mas sabem que o fim é alcançar o grande mar.
Para atingirem este mar necessitam percorrer um longo percurso, por lugares desconhecidos, por vezes bastante sofridos, outros, no entanto , lindos. Percorrem montanhas, atravessam vales, rompem pedras, cruzam sombrias matas.
Parece não ser um caminho agradável, mas é assim que um pequeno rio se torna grande . São estes caminhos , por vezes tortuosos que lhe proporcionam crescimento, pois outras águas vai absorvendo , até que seu tamanho se torne suficiente para seguir seguro rumo ao oceano ...lugar de descanso .
Mas apesar dessas circunstâncias , as águas de um rio podem ser abençoadoras . Fecundam plantações, saciam o sedento, fertilizam a terra, alimentam o faminto, transportam indivíduos, dão vida a outras vidas. Venerável função !

Assim é a  vida. Vem de uma pequena fonte. Pequena nasce, sem saber o que vai encontrar em seu trajeto, tendo a única certeza que o fim será a morte. Por isso em seu percurso almeja se tornar sempre mais forte. 
Em seu caminho se depara com muitas surpresas, às vezes formidáveis, mas muitas vezes amarguráveis. Há momentos em que está no alto da montanha a contemplar belos horizontes. Noutros pode estar em solitários vales , precisando romper rochas, atravessar sombrias matas. 
Mas é no decorrer destes momentos, encontrando outras vidas , é que ela obtém crescimento , adquire amadurecimento . E, apesar de invariáveis circunstâncias , uma vida pode ser abençoadora. Fecunda corações, modifica o que está seco , fertiliza mentes , sacia almas sedentas , direciona perdidos, dá vida a outras vidas. Imprescindível função! 
Assim é o rio da vida.

                         Haliny 

quarta-feira, 19 de setembro de 2018

Tempestade

Elas já anunciavam.
Tantos dias de nuvens culminaram numa intensa tempestade.
Chuvas torrenciais inundam meu jardim. Se eu não drená-la tanta água destruirá suas flores.
A enchente penetrou o corpo endógeno querendo afogar a alma. Para que ela não se afogasse precisei drená-la.
Olhos a escoar tresloucadas lágrimas.
Esta alma, antes sufocada, agora já se sente mais aliviada, refrigerada.
Lágrimas são curativas, acalentam a alma, desvanecem sua dor, desbaratam sua angústia.
Que minha alma não as reprima; que permita que elas drenem as águas dessa sufocante tempestade para que possa sentir a brisa da felicidade.

                                          Haliny  

terça-feira, 18 de setembro de 2018

Ouvindo a voz do silêncio


Para dar voz à alma, me expresso em versos.
Mas e quando a alma cala?
É preciso descobrir o que pelo silêncio ela fala.
Silenciei para ouvir o seu silêncio. Este silêncio que não é sinônimo de tranquilidade grita furiosamente.
  Ela não abriu a boca, não disse palavras; mas pela janela dos olhos a me mostrar algo estava:
“Por que é que se repete? Por ser bonito. A gente quer a repetição do beijo, do doce, do poema, do pôr do sol... A alma não quer ir pra frente”

A alma não quer ir pra frente

Rubem Alves a traduz bem: ela não quer ir pra frente!
Quer ficar ali, mesmo sabendo que é hora de partir.
Angustiada, não quer abrir mão do que tanto procurava; quer repetir a nostálgica vivência.
Se sente vazia, mas cheia de ausências.
Falta daquele sol que iluminara sua casa.
Saudade do lugar antes percorrido.
Esperanças que se esvaíram no ardor do desejo.
Chamas que se apagaram no calor do inverno.

Haliny

Não há jardim sem nuvens

Hoje elas voltaram: as nuvens.
Meu desejo foi como uma linda borboleta que pousou no meu jardim. As borboletas são assim. Lindas, mas nascem para serem livres. Quando visitam nosso jardim temos que aproveitar o momento, contemplar sua beleza antes que se vão.
Como uma colorida borboleta ele pousou em minha mão. Eu sabia que a qualquer momento ele iria voar. Eu poderia fechar a mão, prendendo-o, mas assim eu o sufocaria. Aproveitei o momento enquanto ele estava ali. Contemplei sua beleza. Sei que fui agraciada com sua presença, pois o pousar de uma borboleta em nossa mão é coisa rara, cara. Ele foi assim, me proporcionou um lindo e raro momento e eu me envolvi ao máximo com sua presença. Foi mágico. Ele escolheu meu jardim!
É engraçado. Eu achava que meu jardim era simples demais para atrair borboletas. Resolvi plantar flores novas, flores simples, mas diferentes das que eu já tinha, com mais cores. Mas muitas vezes as coisas simples são mais tocantes que as exorbitantes. Enfim, eu sei que foram estas flores que o atraíram. Como uma linda borboleta.
Mas voltando às nuvens. Sim elas voltaram. Só que eu aprendi uma coisa: nuvens trazem a chuva. Chuva traz o renovo. Jardins precisam de chuva. Jardins precisam de nuvens, já que a constante presença do sol pode queimar suas flores. Sombras também são importantes, proporcionam descanso, equilíbrio.
Vou deixar que as nuvens reguem o meu jardim para alimentar minhas flores. Elas podem ficar ainda mais vistosas podendo até atrair outras borboletas.
Isso é a vida. Devemos aprender a extrair o que necessitamos até daquilo que achamos que não deveria estar ali, o que achamos que nos atrapalha. Mas muitas vezes esquecemos que  aquilo que não queremos na nossa vida pode ser uma importante coluna que sustenta o nosso edifício, ou seja, se a tirarmos, o edifício desmorona e aí...
Sem chuva não há flores. Sem as nuvens meu jardim não seria regado.
A linda borboleta voou, deixando lindas lembranças, saudades. Mas não sei. A vida às vezes é tão surpreendente. Quem sabe um dia ela não volta a pousar no meu jardim...
Vou adorar vê-la novamente.

                                                                              Haliny 

Aprendendo a voar...


Nossa! Como é bom aprender a voar.
Mesmo que ainda em pequenos espaços, já consigo ver novas paisagens. Paisagens estas, antes inacessíveis para mim.
Em um desses pequenos voos que me permiti ao longe vi uma árvore. Uma das minhas primeiras novas visões. Ela foi tão convidativa, o vento que a balançava, a fazia  acenar para mim.  Logo se tornou meu desejo. Mas achei que eu ainda não estava preparada para alcançá-la, que ela estava muito distante de mim.
Eu quis pousar nela, saltar dentre seus galhos, provar dos seus frutos. Ela parecia uma deliciosa novidade, me oferecendo coisas que eu jamais provei na gaiola.
Voando devagar, decidi que eu queria tentar chegar até ela. Mesmo com meus medos, meus receios e minhas dúvidas, resolvi não deixar que estes me impedissem de lutar pelo meu desejo.
 Continuei voando e, de repente, lá estava eu, pousando em um dos seus galhos. Eu estava com incerteza se realmente eu podia tocar-lhe. Fiquei assustada, pois ela tinha muitas folhas, como se fosse intransponível. Esperei um pouco, respirei. Avistei uma pequena abertura e foi ali que comecei.
Não conseguia acreditar que eu estava começando uma incrível aventura. Deliciosa!
Bem, eu ainda estou no início dessa aventura. Ainda há muitos galhos para eu explorar. Não sei se vou conseguir. Não sei ela será minha morada. Não sei se ela vai permitir que eu continue, pois ela é tão reservada. Mas por enquanto, eu estou curtindo o momento; sem pressa, ainda há tempo. Ainda há outras paisagens que quero ver e quem sabe eu não encontre outras árvores. A vida é uma surpresa. Cada voo me apresenta algo diferente. Quero apenas viver este momento intensamente.


                                               Haliny

Asas da liberdade

Como é prazeroso dar permissão a si mesmo.
Inefável força de conseguir quebrar as grades que me cercam e sentir a brisa da liberdade.
Por toda a vida estive presa. Não me prenderam à força; deixei que me prendessem, me prendessem em suas vontades.
Mas agora descobri que essas grades estão envelhecidas pelo tempo. Este mesmo tempo que me faz crescer e tornar-me mais forte. Já não caibo mais dentro dessa gaiola. Ela tornou-se pequena para o tamanho que venho adquirindo. Minhas asas rogam por voar. E eu preciso deixar que elas voem mesmo que ainda não saibam já que o tempo de prisão não permitiu que elas aprendessem no tempo necessário. Minhas asas estão atrasadas, travadas. Mas aos poucos eu consigo movimentá-las. Eu as exercito, as alongo. Dou rasos voos em pequenos espaços. Acho que logo elas estarão prontas para partir e explorar o imenso céu.
Mesmo que eu tenha quedas, sei que estas me tornarão mais experiente me dando maior preparo para voos mais duradouros, me tornando ainda mais forte.
Dar liberdade a si mesmo é indescritível, é um mundo que não cabe em mim. Preciso sair, preciso voar, preciso cair.
Que eu caia por querer aprender a voar, do que morra por me deixar continuar presa.


                                                  Haliny  

E o sol volta a brilhar

"O brilho do sol, no lado de dentro da gente, se chama sonho. "
                            Rubem Alves 

Hoje o sol voltou a brilhar para mim.
No céu um azul suave...
As obscuras nuvens se foram e um suave calor acalenta meu corpo que ontem sentia frio.
Ao olhar para o sol, sorrio.
Delicioso sentir o toque dos seus raios. Ele me revigora, me torna disposta, me contagia, me apavora, me ilumina, me faz levantar da cama, ir para fora! É incrível como ele me transforma.
Ah!
Hoje o sol voltou a brilhar...
...a brilhar dentro de mim.
As obscuras nuvens se foram e os raios que tocam meu corpo, atravessam minha pele, transpassam o coração aquecendo a minha fria alma.
Ao sentir o toque do sol, ela sorri.
Delicioso abraço. Suaves beijos em sua face. Ah ela não quer ver as nuvens novamente.
Esse sol a faz levantar, a torna quente, serena, maravilhada, aturdida, excitada! Nossa! Um turbilhão de emoções. É incrível como ele a transforma. Seu maior desejo? Que tão cedo seu sol não vá embora. Que permaneça e, por um longo tempo, a aqueça.
Que a envolva em seus raios...
Que me envolva em seus braços...


                                          Haliny

E as nuvens partem...

Amanheceu.

Tenho a promessa de um  novo dia. Um dia em que o sol pode voltar a brilhar.
Mas não sei.
Nuvens ainda perduram no céu. Às vezes elas ameaçam se afastarem ao permitirem que pequenos reflexos do sol as atravessem e me toquem. Mas, logo elas retornam.
A manhã foi assim: ameaças de luz, esperança de calor. Incertezas...

Entardeceu.

As nuvens decidiram: foram embora. E o sol? Ah ele estava lá. Lindo, quente, me alegrando profundamente. É! Minha esperança se concretizou quando meu dia ensolarado finalmente chegou.
Felicidade serena.

Amanheceu.

Tenho um encontro marcado com o desejo. Esperança de que minha alma novamente poderá sentir o calor do sol, voltar a ouvir a música desejada.
Mas... Não sei.
Nuvens ainda perduram...
...vão e voltam.
A manhã foi assim. Receios. Incertezas. Esperança aflita.
Ser ou não ser?
Pegar ou largar?
Viver ou morrer?
Lutar ou abrir mão?
Eis a questão!

Entardeceu.

As nuvens decidiram: foram embora. O toque estável do sol me faz escolher.
Vou ser.
Vou pegar.
Vou viver.
Vou lutar.
Se eu serei, não sei. Se eu conseguirei segurar, não sei. Se eu viverei eternamente, não sei. Se eu vencerei, eu também não sei.
“Só sei que nada sei.”
Mas sei que quero tentar, mesmo que eu não conquiste. Se eu conquistar, desmedido e insano será o prazer. Se não, ao menos não sentirei o peso, nem ouvirei a voz do arrependimento me dizendo:
-Você deveria ter tentado. Por que não teve coragem? Talvez tivesse conseguido. Quem sabe? Você perdeu. Perdeu o quê, se nem ganhou? Se nem lutou? Não mereceu. Ficou parada esperando que a vida lhe trouxesse. Mas você que deveria tê-la feito acontecer.
Eu não quero sentir esse peso. Não quero ouvir essa voz. Pois é melhor sentir a dor da perda de uma luta do que a dor por não ter tentado, a dor do arrependimento. Quero poder dizer, ganhando ou perdendo, que tive coragem para correr atrás, para lutar por ele...
...meu desejo.
Bem. A tarde está findando. Já que eu tinha voltado às velhas roupas, preciso me trocar. Vestir a roupa da diferença, passar o perfume da serenidade e calçar os sapatos da coragem.
Está chegando a hora de encontrar com meu desejo e eu não quero chegar atrasada para não perdê-lo.
Amanhã retornarei para dizer se o sol permaneceu ou se voltaram as nuvens.


                                                 Haliny

Nuvens versus Sol


Olho para o céu. Já não chove mais. E o frio antes severo, já não está tão agressivo. Mas ainda vejo nuvens cinzentas a cobrir o sol. Às vezes, elas se abrem, deixando que um leve raio de sol me aqueça neste frio sereno.
Frio? Calor? Não sei o que esperar.
O tempo me faz promessas de trazer um lindo dia de sol. Mas as nuvens insistem em ficar. Elas querem encobrir meu sol. Ou será que este não quer me aquecer? Não mereço seus raios?
Ah alma minha. Olha para fora. Pequenos raios atravessam as janelas do coração e tocam em sua pele gelada. Faz-lhe promessas. Expectativa de verão. Porém vêm as nuvens, e aí...
Não sabe o que esperar, não é?
Será que seu sol vai permanecer ou será que as nuvens o afastarão para sempre?

                                                    Haliny

Inverno da alma

Tá frio aqui...
Pela janela vejo a chuva a cair. O frio vento que vem de fora eriça o pelo do meu corpo.
Tá frio aqui...
Quem diria que após uma semana quente viria uma semana fria.
Parecia um afago de verão, eu sorria.
Um bem estar...
Tá frio aqui...
...aqui dentro.
Ele atravessou a pele, transpassou o coração, chegou à alma, que agora novamente congela.
Essa alma que saíra para sentir o calor do sol, agora para seu canto retorna para não ter que enfrentar o mais frio dos invernos.
Tá frio aqui...
Aqui do meu canto, eu o observo. O frio que vem de fora eriça o pelo da minha alma.
Quem diria que após uma semana quente viria uma semana fria...


                                                   Haliny

O despertar da vida


A vida sentia falta. Faltava-lhe um algo que a faria sorrir. Ela sabia o que lhe faltava. Porém cansada de esperar por esse algo, ela desacreditou que um dia pudesse encontrá-lo. Então, a vida repousou no “canto solitário do desânimo”, perdendo sua razão de existir.
Por dentro, o que essa vida ainda desejava era conseguir se levantar. Mas aquela falta ainda a esmorecia. De repente, ela ouve uma melodia que a faz despertar. Cansada das velhas músicas, enjoada de estar naquele canto, a vida se levanta, se banha para tirar as velhas angústias, se veste com a roupa da diferença, se perfuma com o perfume da serenidade, se calça com os sapatos da coragem e em seu rosto coloca um sorriso de felicidade.
A vida estava dando oportunidade ao novo, sem se importar com o retorno.
Aquela música a convidava. E, quando a vida com ela se deparou, se surpreendeu, pois não era aquela música o algo que ela tanto desejara!

                                                     Haliny