quinta-feira, 2 de maio de 2019

Nostalgia outonal


“Meu sol de verão...
Pena que assim como a estação,
Chegará o momento da separação...”

E o outono chegou.
Harmônico, frio.
Ainda vejo ao longe, reflexos daquele sol em meio a nuvens alaranjadas. E pensar que há um tempo, não muito distante, ele me aquecia de uma forma...
Mas agora o verão findou, levando junto aquele ardente sol.
Ah! Quanta falta sinto do seu aquecer em mim, do seu brilho, da sua alegria.
Você partiu meu sol de  verão, deixando anelante minha alma. Meu corpo estremecendo com o frio que usurpa o lugar das chamas.
Sua partida ofuscou o brilho das minhas manhãs.
Coibiu  a diversão das minhas tardes.
Encobriu o desnudar das minhas noites.
Silenciou nossos falares.
Ah! Aqueles falares em meus ouvidos me faziam arrepiar...
Até o canto dos pássaros soam distante diante da sua ausência.
Outono: uma despedida triste. Essência da nostalgia.
Lembranças do que foi belo, quente e florido.
Sopro de uma brisa fria desvanecendo o calor.
O outono bateu na janela do  coração, adentrou a pele, envolveu a alma.
Ele começou em mim; prévia de um novo inverno
Daqui a pouco, minhas folhas secarão e cairão. O vento pra longe as levarão, a chuva lentamente as desfarão.
O vento levará as folhas secas: aquelas lembranças construídas com nossa vivência.
Triste é saber que enquanto eu sou outono, você continua sendo sol de verão, aquecendo outro continente, alegrando outro coração, desnudando outra alma.
E eu só...
Aqui almejando que novamente venha me aquecer e me leve junto a você.


                                                                                                  Haliny

sábado, 13 de abril de 2019

A garota de dez anos atrás


Vejo no Facebook diversos amigos postando fotos de 2009 com uma de 2019, mostrando como eram e como estão agora. O intuito é fazer uma comparação, destacando principalmente as mudanças estéticas. Ok, achei a ideia bem legal; é divertido ver como algumas pessoas mudaram: o corpo, o cabelo, a vestimenta, o rosto...
Não tive vontade de entrar na brincadeira. Mas então me deparei com a seguinte frase:

“ A garota de dez anos atrás acharia a mulher que você se tornou uma pessoa incrível.”
                                                                                                            (Larissa Borges)

Daí, você, leitor dos meus escritos, já sabe, né? Mil coisas passaram pela minha mente. Por que não? Por que não entrar na brincadeira? Mas não simplesmente postando fotos que mostram se mudei ou não em dez anos fisicamente, apenas! Vou além; farei uma fotografia descritiva da alma. Sua alma continua com a mesma estética Haliny? Tem o mesmo peso? Usa as mesmas roupas? Calça os mesmos sapatos? No rosto o mesmo sorriso?
Deixe a timidez, de dez anos, longe de você e revele-se! Brinque também, da maneira que você gosta, mas mostre suas mudanças, seu crescimento, sua força. Seja inspiradora!
Haliny – a garota de dez anos atrás...

Era uma vez uma garota insegura, medrosa, reprimida, de poucas palavras, poucos amigos, cercada pela muralha da timidez, raro eram as pessoas que conseguiam acessá-la, tirar-lhe um tímido sorriso.
Mas ao mesmo tempo aquela garota, mesmo com muita dificuldade, correra atrás do que queria. Ela tinha grandes sonhos, intensos desejos, mas sempre era como se tentasse correr na água; várias coisas atravancavam seus passos, porém não desistiu.
Há dez anos aquela garota, mesmo timidamente, entrava para a faculdade. Que passo ousado para uma pessoa tão tímida! Um desafio! Difícil deixar a casa, aquele conforto seguro, porém perigoso, ter de enfrentar sozinha um mundo desconhecido e muito maior do que o que ela vivera até ali. Ela pensava que a vida mudaria; que faria amigos, tornaria mais independente, deixaria de ser uma simples adolescente.  Mas não fora assim. Logo ela viu que suas amarras mentais a acompanhavam, impedindo que delas se desvencilhasse. E continuou correndo em águas. Ela caminhava, mas não progredia. O pior era que ela sempre esperava que algo surpreendente acontecesse em sua vida, sempre esperava que esta lhe trouxesse os objetos dos seus sonhos; sempre esperava que alguém a tirasse daquelas águas e que a levasse a uma nova vida. Ela não conseguia enxergar que aquele milagre do novo, do surpreendente, habitava em sua mente. Ela não enxergava que somente ela mesma poderia tirar-se dali apenas mudando a direção dos passos, parar de andar só nas águas e olhar para a terra tão próxima e caminhar em direção a ela. Aquelas  coisas que atravancavam seus passos estavam em sua própria mente. Precisava mudar o olhar, mesmo que não fosse fácil, livrar-se daquilo que sempre acreditou. Olhar outras direções, criar novas possibilidades e caminhar para onde desejasse. Na sua mente, estava o poder da mudança mas ela não enxergava!
Os anos foram se passando e, a cada ano, aquela garota continuava esperando e esperando que a  mudança chegasse. Mas essa não chegava e, ela que não sabia que nem chegaria se ela continuasse esperando sem buscar, ainda conseguia dar seus passos, que não lhe bastavam. Ela queria caminhar por novos lugares, ver outras paisagens.
Apesar disso, ela se via cada vez mais infeliz, retraída, desanimada. Viu sua juventude passar sem desfrutá-la de fato. Passou por pessoas que se tornaram amigas, mas estavam adiantadas, não  ficaram. Via-se cada vez mais sozinha e viu que já estava começando a perder as forças por caminhar demais naquelas águas obscuras. O pior poderia chegar a qualquer momento: afogar-se em seu próprio oceano; permitir que as velharias da sua própria mente, matassem seus sonhos, tirassem a vida. Se é que podia chamar de própria vida a vida que levava, já que ela só esperava sem agir.
Um dia, no chão do seu quarto, caiu. Ali, naquele canto solitário do desânimo, e chorou!
Ela chorou...
Suas lágrimas misturaram-se com as águas. Tempestade naquele oceano. Aquela garota não sabia mais quem era, em quem se tornara. “Quem é você, Haliny? Onde estão os seus sonhos, seus objetivos? Onde estão os amigos? Onde está sua casa? Onde está sua alma?” Ela indagou-se. Ali, naquele chão duro e frio, viu-se completamente só. Mas foi ali naquele chão, sentindo-se um nada, humilhada, que a garota finalmente enxergou que tinha de sair daquelas águas que lhe atravancavam o caminhar. Foi o afogamento que lhe trouxe a consciência da importância do respirar, do qual precisava desesperadamente. Oxigenar a alma para não perecer.
O primeiro passo é muito dolorido, mas libertador. Não seria fácil quebrar o costume, mesmo que já estivesse desgastado pelo tempo. Mas foi. Aproveitou o pouco ar que dispunha, a fraca força que ainda nela habitava e se levantou daquele chão, saiu daquele mar para caminhar na terra. Mas ainda estava muito fraca quando chegou à terra. Não sabia para onde ir. Na água conhecia aquele mundo. Mas... e agora? “E agora José?” O que faria? Para onde iria? Sozinha.
Antes precisaria recuperar as forças e deitou naquela areia. Aquele repouso era necessário. Não, era vital! Se ela saísse caminhando do jeito que estava, poderia perder a direção, sucumbir; suas pernas estavam fracas. Antes teria que descobrir o desejo, (re)descobrir, descobrir – tirar os lençóis que pusera sobre os sonhos para não vê-los. E aí sim, quando estivesse recuperada, alimentada, com a mente clareada, poderia seguir segura, mais forte e destemida. Isso não seria fácil. O repouso não foi fácil, ela era ansiosa, queria que tudo acontecesse já! Mas a mudança, o novo caminhar, não viria assim. Ela teria de viver o repouso para redescobrir-se. Tinha que recuperar-se das dores que o velho caminhar impôs em seu corpo que cortava suas entranhas. Precisava alongar os membros atrofiados.
Bem. Para se recuperar, o lugar do repouso foi um divã. Toda a desordem  estava em sua mente. Esta precisava se rever no repouso da psicologia. O repouso foi difícil no início, mas essencial. Na terapia viu tanta, tanta coisa. Descobriu coisas horríveis, mas também coisas incríveis. Teria que fazer um retorno para ver de onde saíra e para onde iria...

Após o término da faculdade, aquela garota voltara para casa. Sentia-se triste, pois não veria mais os amigos nem teria para onde ir. Era hora de conseguir um emprego, mas este não veio. Que frustração! Presa naquele mundo sem poder nada fazer. Sonhava em conhecer um cara especial, mas este não surgia. Tinha vontade de viajar, passear, sair para jantar, mas ninguém a levava. E assim foi por anos, com desejos reprimidos.  Certo ano veio um emprego. Bom! Poderia ver novas coisas, conhecer novas pessoas, quem sabe fazer amigos?
Só que o que mudou foi uma situação e não sua mente. Continuava correndo na água. Ela não conseguia se relacionar com as pessoas, fazer conexões. Com o tempo, sentiu-se mais frustrada e isolada. Vieram as crises. Descobriu que aonde quer que ela fosse, continuando a carregar aquelas amarras mentais, não haveria transformação. Não seria simplesmente a mudança das situações, seria além. Não era fora, era dentro. Era ela que teria de mudar. Só ela. E só, ela teria que enfrentar a ela mesma. Só não sabia que seria tão doloroso, que seria como arrancar a própria pele, escorrer sangue, que teria que desnudar-se.
E assim, mesmo com muita vergonha, desnudou-se, tirou as velhas roupas e olhou para dentro de si. E foi, lenta e timidamente que suas amarras começaram a se desfazer. Ela se assustou tanto! Descobertas incríveis. Aos poucos se recuperava naquele hospital da alma. Logo poderia se levantar para dar uns primeiros passos, visualizar uma rota. Descobriu que tinha sido forte por andar tanto tempo presa e que precisaria de muita força para suportar a dor da sua metamorfose.
Mas valeu a pena! Valeu o esforço. Vale a dor. Hoje em 2019, aquela garota se reconstrói, torna-se mulher. Claro que ela sabe que essa construção não terá um fim, pois ela aprendeu que viver é isso: uma eterna reconstrução, ter a capacidade de se refazer após cada queda. Isso é crescimento, evolução, amadurecimento. Ficar estagnado na vida pode ser letal. A vida é uma constante mudança, constante movimento; precisa de ação. Quando paramos adoecemos, literalmente. Ficamos cheios de neuroses.
Ela adquiriu uma força incrível para conseguir o que quer. Já não espera mais um grande milagre chegar, pois ela é o milagre; corre atrás, luta. E mesmo que não consiga, sente-se feliz porque agora ela encontrou sua capacidade de tentar. Hoje, tudo é resultado de suas próprias ações. Hoje, ela vai sozinha; já não mais depende que alguém a leve. Se tiver companhia, ótimo; se não, não há problema: ela é sua melhor companhia. Sai para jantar, comer uma pizza, ir ao cinema. Ela ama estar só com ela mesma, pois assim pode ouvir melhor a voz da sua alma. Mas isto não a impede de conhecer novas pessoas. Ao contrário. Ela busca e conecta-se a novas amizades. Aliás, ela está mais seletiva; não aceita qualquer amizade não! Cansou de amizades abusivas. Hoje, ela sorri com ousadia, anda de cabeça erguida, é determinada, vê-se incrível; não tem medo de mostrar-se. Deixou de usar aquelas velhas roupas sem cor nem alegria para vestir-se com  as novas e coloridas roupas adquiridas.  

Bem! Esta não é uma história clichê. Não tem o final feliz como nos contos de fadas. Aliás, esta história não tem fim. Ainda bem! Ainda há muita luta e mudança a ser feita. E isso não depende de uma fada; depende somente dela, e ela, não quer fim; quer vírgulas, continuidade.
Ah! Você pode estar se perguntando: “E o príncipe?” Ela não quer um príncipe encantado. Príncipes encantados são efêmeros, fantasias. Ela quer um homem, humano, com belezas e defeitos. Um homem real.
Uau! Quanta transformação! Foram muitos sofrimentos neste processo, mas essenciais.

A garota de dez anos atrás não sabia que dentro dela habitava uma mulher incrível, que só precisava nascer. A mulher de 2019 descobriu que a garota de dez anos atrás era como uma planta, cuja beleza estava escondida sob folhas secas,  que só precisava ser podada e regada para florescer o melhor de si.

Na garota de dez anos atrás havia uma mulher forte, linda e invencível que apenas dormia. Mas os intensos e clamantes sonhos a fizeram acordar para vivê-los a cada dia!    


                                                                                                      Haliny